domingo, 19 de janeiro de 2014

FB 1 - Mudando as Regras - 5.


FRENTE DE BATALHA A TRILOGIA
Mudando as Regras – Parte I
As aventuras do Capitão Dorian Alkon na linha de frente do Quadrante Gamma
Por Marcos De Chiara

Capítulo V

Setor Kalandra
Território da Federação
SST(1) : 17h 45min 04seg  pm

Durante a aproximação da base a USS Albedo passa por duas naves da Frota. Uma era um cruzador pesado da classe Korolev de 442 metros de comprimento e uma outra da classe Cheyenne, um destróier de 380 metros. A tenente Allison não conseguiu deixar de fazer um comentário.

_Sinto-me uma sardinha navegando entre baleias.

_O que é isto tenente? Complexo de inferioridade? – brincou o capitão.

_Desculpe, senhor. Creio que seja saudade de pilotar um cruzador pesado como a Babel.

_A Albedo tem sido o nosso lar por quase um ano e não tenho queixas dela. Ela nunca nos deixou na mão. Ela pode ser pequena, mas tem provado o seu valor.

_Cento e sessenta e cinco metros de comprimento, trinta e quatro de altura, sessenta e dois de largura, oito decks, podendo atingir warp 9,6 e mantê-lo por doze horas. Eu conheço as especificações, senhor. Sei do que ela é capaz, mas se me permite falar francamente...

_Nunca impedi meus Oficiais sêniors de serem sinceros. Prossiga.

_A nossa equipe é uma das melhores da Frota...Porque eles não nos deram uma nave maior? Quem será que desagradamos tanto no alto comando?

_ALLY! – McCormick tenta deter os comentários de sua amiga.

_Não tem problema, senhor McCormick. Creio que a nossa timoneira esteja certa. Nesses últimos meses nos colocaram na geladeira. Percebemos isso pelo tipo de missões em que nos enviaram. Se existe um culpado nisto tudo sou eu.

_Desculpe, capitão, eu não pretendia... – Allison percebeu que havia constrangido o seu capitão. O incidente com os Maquis e os Breens no ano passado ainda eram lembranças dolorosas para todos.

_Se preferir uma transferência, tenente, eu entenderei.

_Desculpe, senhor, esta não foi minha intenção. É que às vezes eu não consigo ficar calada e falo demais. O senhor tem o meu maior apreço e respeito. Me desculpe.

_Eu já pude sentir que alguns entre nós me culpam por ter entrado com a representação contra o Alto Comando da Frota e que isso prejudicou a carreira de todos nós; apesar de que, pelo que fizemos, deveríamos ter recebido honrarias, condecorações e promoções.

_O senhor agiu corretamente. Seguiu o que os próprios regulamentos da Frota rezam. – comenta o alferes Gilbert do posto táctico.

_Certamente não é a maioria que pensa assim do senhor, capitão. Acredite. O senhor continua tendo o nosso apoio. – reitera McCormick.

_Eu sei. Vocês têm sido bons amigos e pacientes. Acima de tudo sei que posso contar com a lealdade de todos. É o mínimo que posso esperar dos meus oficiais de ponte.

_Talvez tenham nos chamado até aqui para repararem a injustiça que fizeram! – diz Allison tentando consertar as coisas.

_O centro de controle de doca da base está nos contatando. Solicitam que atraquemos pela comporta sul. Toda a tripulação deve desembarcar e se dirigir para o nível sete. Um oficial espera o senhor, capitão, para dar as novas ordens. – informa o tenente Zagar, que durante toda a discussão manteve-se neutro. Por ser novo na equipe acreditou que era melhor ficar calado.

_Desembarcar toda a tripulação? Isto é incomum... – McCormick estava intrigado.

_O que será que está acontecendo? Não deve ser nada grave, pois não há nenhum tipo de alerta na estação. – diz Allison se certificando em seu console e depois olha para Gilbert, esperando confirmação. Ele ergue os ombros em sinal de que nada de estranho havia detectado.

Ao invés de também ficar curioso, Alkon pede ao computador para localizar a Comandante Okaido.

DECK 4 – ARBOREDO _responde a voz sintética.

_Senhor McCormick assuma os procedimentos de atracação. Se houver algo que mereça minha atenção, sabe onde me encontrar. – Alkon se ergue de sua cadeira, olha para o alferes Gilbert estranhando o fato dele ainda estar na ponte e pergunta:

_Senhor Gilbert o seu turno já não acabou? Onde está o senhor Klag?

_O senhor Klag foi verificar um problema nos tubos ejetores de torpedo e avisou que irá se atrasar um pouco.

_Sei...Espero que não seja nada sério.

_Acho que não, senhor. Só não reportei antes porque ele disse para não preocupar o senhor e...

_Tudo bem, alferes. Não precisa ficar nervoso. Eu já entendi. – Alkon sorri do desespero do jovem e em seguida se dirige a piloto. -Tenente Saint-John...Não arranhe a lataria. – Alkon sorri demonstrando que da parte dele não havia ressentimentos pelos comentários dela.

_Pode deixar com a gente, capitão. – responde a jovem também com um sorriso.

Quando o capitão sai, Allison faz um novo comentário:

_Você já reparou que desde que saímos do sistema Hatariano os dois não ficam mais juntos na ponte?

_Soube por Dorn que eles jantaram na cabine dele uma noite dessas... – emenda Gilbert.

_Será que eles... –  Allison joga um pouco de pimenta na fofoca.

_Não sei. Acho que isto é um assunto privado e que só diz respeito aos dois. – responde McCormick da cadeira do capitão criticando a malícia de seus colegas, porém, em seguida, não resiste em fazer o seu comentário – Mas que o clima entre eles está esquisito, isto está. – ri.

A Tenente Kimberly, que é sempre muito séria e compenetrada em seu serviço, não consegue deixar de rir do comentário do oficial de ciências.

_Se eles estão tendo um caso e não querem demonstrar não estão tendo muito sucesso nisto. Está todo mundo comentando. – diz Zagar.

_Ora, Ora! Se não é o nosso garoto prodígio! O que você entende de romances, Zagar? – pergunta McCormick em tom jocoso para o jovem rapaz ao seu lado.

_Muito pouco, mas o suficiente para saber que o deles começou errado e parece não ir nada bem.

_Acho melhor pararmos com essa conversa. O senhor têm razão. Isto é assunto deles. – concorda Gilbert com o oficial de ciências temendo estarem maculando a reputação de seus oficiais superiores.

_É o mal de uma tripulação pequena. Somos apenas cento e três pessoas e é difícil manter um segredo assim aqui. – diz Allison em seu comentário final.

_Estamos é virando um bando de fofoqueiros, isso sim – diz McCormick em auto-censura – Vamos nos concentrar em nossos afazeres.  – McCormick levanta de sua estação e se dirige até a cadeira do capitão onde se senta para dar as ordens. _Zagar, informe a tripulação para se prepararem para o desembarque. Allison...Reduza a velocidade para meio impulso. Atenção aos manobradores. Gilbert... Informe qualquer coisa suspeita na estação. Faça uma sondagem.  Zagar... Abra um canal de comunicação para o controle de doca.

_Freqüências abertas, senhor.

_Aqui é a USS Albedo pedindo permissão para atracar. Solicitamos raio trator na abordagem final.

“Entendido, Albedo. Manobra de atracagem deverá ser feita manualmente. Repetimos. Manobra de atracagem deverá ser feita manualmente. Estamos sem raio trator. Problemas técnicos. Sejam bem vindos a base 375 da Frota Estelar.”

_Você ouviu o homem, Ally. Para quem estava querendo emoção, aí está a sua chance .

_Ora, Doug...Este tipo de atracagem eu faço de olhos vendados. Já se esqueceu que eu pilotava cargueiros e naves de transporte antigamente ?

_Eu nunca me esqueço de nada. – respondeu sério. Dizer que ele se esquecia alguma coisa o irritava. Allison, como uma velha amiga, sabia disso e o provocava. _ Bom, então esta é uma boa oportunidade para relembrar os velhos tempos.

A Albedo voou serenamente até o local indicado para atracação e a fez suavemente devido a destreza da piloto Allison Saint-John. Todos na ponte a parabenizaram pela manobra perfeita.

_Obrigado.Obrigado. Pago uma rodada para todos no bar da base.

_Combinado. Gilbert...Deixe os principais sistemas no automático e vamos desembarcar. Será bom esticar as pernas em um outro cenário.

Zagar apertou um botão em um aparelho em seu braço, acenou para os companheiros, e desapareceu. McCormick, Gilbert, Kimberly e Allison , como não possuíam um teletransportador pessoal, tiveram que pegar o turbo-elevador para o deck dois, onde iriam pegar suas mochilas em suas cabines.

Enquanto isso, no arboredo, Alkon procurava a sua imediato. O local não era grande. Mas devido a grande concentração de vegetais, dos mais diferentes portes, facilmente poderia se perder. Era um local agradável, de clima tropical e cheiros dos mais diversos, porém agradáveis ao olfato.

_Sarah? – perguntou ao entrar em meio aquele pequeno bosque.

_Aqui! – respondeu ela ao fundo.

_O que está fazendo? – perguntou ao vê-la usando uma luva amarela em uma mão e uma pequena tesoura de poda na outra.

_Estou cuidando dos meus bonsais.

_Você é que os fez?

_Sim. Aprendi com um tio meu. É um ótimo passatempo e uma boa terapia.

Alkon ficou admirando as mãos delicadas de Sarah apararem as pequeninas miniaturas do reino vegetal. Durante todos estes meses em que serviam juntos, raros foram os momentos de lazer que compartilharam e quando fizeram estavam sempre acompanhados com mais uma dúzia de pessoas. Dificilmente encontravam tempo para colocar o papo em dia ou jogar conversa fora, ou até mesmo para saber dos gostos e hobbies uns do outro. Por um momento esquecera-se o porque viera ao seu encontro, até que despertou de seu pequeno devaneio e falou:

_Recebemos ordens de desembarcar. Todos. Sem exceção. Não acha isto estranho ?

_Talvez precisem descontaminar a nave.

_De quê? Radiação de bárions não deve ser. Não temos usado altas dobras nestes últimos meses. Pressinto que seja algo diferente.

_O que poderia ser então? O que os seus poderes betazóides dizem?

_Não muita coisa. É apenas uma sensação. Temo que ela não seja boa.

_Sabe, Dorian, você me assusta às vezes com esse dom. Você dizia a mesma coisa quando íamos fazer uma prova do Capitão Selak.

_Sim. Infelizmente eu sempre estava certo. – riu.

_É. – Sarah riu também – Infelizmente. Tive péssimas notas em história da Federação. Algo que depõe contra as minhas qualidades de imediato.

_Mas você possui outras qualidades que se sobrepõem..._diz Alkon com certa malícia. Percebendo que Sarah ficara sem graça, emenda um outro assunto:

_Lembra de uma vez, na academia, que realizamos uma sessão espírita por conta desse meu dom?

_Nossa! Se eu me lembro? Tem gente querendo nos pegar até hoje por causa disso. Você se fez passar por um médium e espalhamos o boato no campus da academia. Quando deu o horário da sessão, à meia-noite, o prédio dos nossos alojamentos quase entupiu de gente querendo ver a novidade. Se não me falha a memória...Cobramos dez créditos por uma sessão em grupo e cem por uma consulta particular. Na época ninguém sabia que você era um telepata. Você ficou se divertindo revelando segredos das pessoas fingindo que recebia as informações de espíritos. Muita gente ficou impressionada. Alguns até choraram! Coitadinhos!

_Ah, ah, ah! Eu soube que na Terra, no século vinte, tais práticas eram muito apreciadas pelas pessoas e resolvi fazer um revival desta prática.

_Tudo foi muito divertido, para não dizer lucrativo, até descobrirem que era tudo armação nossa.

_Eu não sabia, na época, que não podia ler a mente de um dopteriano.

_Tivemos que devolver parte dos créditos dos cadetes, porque a outra já havíamos “bebido”. Sem falar que ainda recebemos uma reprimenda do administrador do campus e do diretor da academia. Se não fosse eu você teria virado picadinho.

_É...Você sempre me protegeu...

_Você era um garoto fracote e meu melhor amigo. O que eu poderia fazer?

_Sempre fomos amigos e tem certeza que isto é tudo que seremos ? – Alkon estava melancólico e Sarah não gostou do rumo que a conversa estava tomando. Alkon a estava pressionando e ela não gostava de ser pressionada.

_Creio que foi o que combinamos naquele jantar.

_Desculpe. É que está sendo difícil para mim. Como betazóide, conter minhas emoções, é ir contra a minha natureza. A minha raça é regida pela impulsividade, pela liberdade de emoções, pelo viver o momento.

_E você acha que para mim não é difícil, Dorian? Eu tenho que manter uma postura como oficial na nave, enquanto  a mulher dentro de mim gostaria de beijá-lo em público não se importando o que os outros vão pensar. Mas temos que seguir os protocolos. Respeitar a hierarquia que juramos seguir.

_A Frota já não adota os votos de celibato há muito tempo, e eu não me importo com o que os outros irão pensar de nós.

_MAS EU SIM! – Sarah jogou a tesoura ao chão. Ela estava se descontrolando. Era a segunda coisa que ela mais odiava. – Para você é muito fácil antecipar uma...uma reação quando pode saber de ante véspera  o que estão pensando. Mas comigo as coisas não funcionam deste jeito. Eu...Eu sou humana. Para mim, assumir uma relação com o capitão da minha nave, quando eu sou a imediato, não me parece muito ético.

_Nós não estamos falando de ética aqui, Sarah. Estou falando de amor. – Alkon se aproxima e a segura pelos braços.

Os dois ficaram em silêncio se olhando por alguns segundos. Ela pega as mãos dele e se solta, se afastando e ficando de costas para enxuga suas lágrimas. Era a terceira coisa que ela mais odiava. Que a vissem chorando. Alkon tenta mais uma investida:

_Então peça uma transferência se é isto que a impede. Você não acha que estamos perdendo uma oportunidade de sermos felizes?

_Acho que perdemos esta oportunidade há muito tempo.

_Você não pode estar falando sério. Por que aceitou servir comigo? Porque dispensou um excelente posto na USS Cairo? Não espere que eu acredite que foi pela minha grande experiência e prestígio...

Sarah se virou para responder a altura. Justamente quando a conversa estava caminhando para uma discussão o bip do comunicador de Alkon foi ouvido. A conversa foi interrompida momentaneamente. Esta era a quarta coisa na lista do ‘ Eu odeio’ de Sarah. Que lhe cortassem a palavra.

_Pode falar! – responde Alkon com certa irritação na voz.

“Procedimento de atracação completado, senhor. Pessoal efetivando o desembarque. O almirante Petersen está à sua espera. O senhor quer que levemos a sua bagagem?”

_Não será necessário, Gilbert, obrigado. Diga ao almirante que estou a caminho. – o capitão fica olhando para o rosto enfezado de Sarah e então ele estende a mão e toca em seu rosto fazendo-lhe um carinho.

Sarah permite a raiva ir embora , deixando-se dominar pelos seus verdadeiros sentimentos ao fechar os olhos e sentir o seu corpo se arrepiar. Ela então segura as mãos dele e as coloca em torno de si. Ela abre novamente os olhos e o encara. Os dois se abraçam e se beijam. Um beijo que pareceu levá-los além da borda da galáxia.

_Desculpe... Eu não quis chateá-la.... – dizia ele entre um beijo e outro.

_Não desculpe você. Eu tenho bancado a garota difícil... Sei que não tem sido fácil para você também. Afinal o que você viu em mim ?

_Você sabe...Eu sempre tive uma queda por mulheres mais velhas... – sorri.

Sarah dá um leve soco no peito dele e ri. – Velha? Quem você está chamando de velha?Eu tenho apenas  só dois anos a mais que você...

_Eu tenho que ir. – Alkon dá um último beijo – Vou fazer a minha mochila. Tenho um outro encontro, você sabe. Quer que eu mande um ordenança fazer a sua?

_Sim, agradeceria.

Ele se afasta, mas ainda segurava a mão dela e diz:

_Obrigado.

_Dorian...Estas coisas não se agradecem. Vamos deixar rolar e ver o que acontece tá bem? Não poderemos dizer depois que não tentamos e nos arrepender.

_Combinado._ele a solta, caminha para a porta, mas subitamente se volta, corre até ela e a abraça e a beija mais uma vez, antes de sair correndo em definitivo para encontra o tal almirante.

Sarah fica com um grande sorriso de felicidade estampado no rosto. Retira a sua luva , larga-a sobre um balcão e deixa o arboredo em direção ao seu alojamento.

Nem ela nem o capitão notaram que uma terceira pessoa assistira toda a conversa. Detrás de uma árvore, Zagar, o elaysiano, estava com um sorriso perplexo no rosto.

(1)SST Star Ship Time - Hora dentro das naves espaciais.

Texto por: Marcos De Chiara.

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