terça-feira, 2 de agosto de 2016

FRENTE DE BATALHA 2 - FAZENDO LINGUIÇAS - 7

FRENTE DE BATALHA A TRILOGIA
Fazendo Linguiças – Parte II da Trilogia.
As aventuras do Capitão Dorian Alkon na linha de frente do Quadrante Gamma.
Por Marcos De Chiara




                  PARTE SETE

       A viagem na USS Protheus estava calma e fascinante. Timothy Barinni só havia ido ao espaço duas vezes na vida. A primeira foi quando tinha doze anos em uma excursão escolar de História. Tratava-se de uma viagem à Lua para aprenderem sobre exploração espacial. A segunda foi em lua de mel em um cruzeiro até Altair. Depois disso nunca mais saiu da Terra e julgava não precisar já que tinha acesso a todos os cantos do espaço através do milagre das telecomunicações e de seus contatos dentro da Frota Estelar. Mas o real motivo era que Timothy sofria de enjôo espacial. Um bom motivo para ficar na Terra.
      Observava o espaço através de uma escotilha do observatório quando foi abordado pela capitã Sobieski.
         - Você deve ser o Sr. Barinni...Procurando material para a sua reportagem?
      - Oh, olá capitã. – cumprimentou ao observar o distintivo da patente daquela mulher alta e morena – Muito prazer. Eu apenas me perguntava como é que se sabe se estamos de cabeça para cima ou de cabeça para baixo.
        - Não sabemos. A graça está aí. – brincou a capitã. – Desculpe não tê-lo recebido antes. Estava muito atarefada com os procedimentos de partida. Sabe como é...Nave nova, cuidados extremos.
       - Não tem importância, capitã. Eu compreendo. O seu primeiro oficial, o senhor Ian O ´Malley, foi muito atencioso.
       - Se ele não fosse iria se ver comigo. – disse ela em tom de brincadeira – Espero que estejam bem acomodados. Infelizmente não poderei providenciar um tour pela nave por questão de segurança, mas se o senhor ou sua família ficarem entediados sugiro uma visita a um dos holodecks da nave. Temos programas interessantes. Poderão até fazer um piquenique por lá! Por falar nisso onde estão a sua mulher e filhos?
        - Em um piquenique no holodeck três. – sorri Barinni com certo constrangimento.
       - Ah, sei... – a capitão também fica um pouco desconfortável com a resposta.
       - Não leve a mal, capitão. Não é nada pessoal com a sua nave. Na verdade ficamos muito impressionados com ela desde quando a vimos na doca espacial. É uma classe nova, um novo design e dizem que possui uma arma secreta contra os inimigos.
         - Isto é uma entrevista?
     - Desculpe. É a força do hábito. Sei que é um projeto novo do corpo de engenheiros da Frota e que nem deveríamos estar aqui. Só fiquei curioso.
        - Quem não ficaria? Ainda mais um repórter com a sua reputação. Só aconselho para se manter nas áreas de circulação livre e não teremos problemas. Quanto a sua presença aqui agradeça ao almirante Toddman e aos Médicos Sem Fronteiras, a instituição na qual a sua mulher trabalha. De outra forma nenhum civil subiria à bordo no estado político atual. Mas o senhor ainda não me disse por que estava aqui sozinho no observatório.
       - Enjôo espacial. Infelizmente quem projetou os holodecks esqueceu de colocar banheiros neles.
       - Compreendo. Seria uma boa sugestão para o corpo de engenheiros da Frota. Ou poderia dar uma boa reportagem para a INN.
- “A falta de banheiros em naves estelares!” -  brinca Barinni com uma fictícia manchete.
A capitão ri da piada. – Quanto ao seu enjôo creio que o nosso médico poderia lhe receitar alguma coisa.
     - Passarei na enfermaria assim que o meu piquenique acabar. Acho melhor ir andando antes que minha mulher fique preocupada com a minha demora.
       - É muito sensato de sua parte. Avise-os que estão todos convidados para o jantar no salão dos oficiais esta noite. Nove horas está bem?
       - Oh, claro capitão. Para mim está ótimo. Avisarei. Obrigado pelo convite. Até mais então. – Barinni sai do observatório apressadamente.
        A capitão Sobieski observou o repórter até ele sair. Algo dizia que teria problemas durante a viagem. Um homem como ele era irrequieto demais para ficar apenas em alojamento – refeitório – holodeck. Precisaria avisar a segurança da nave para ficar de o olho nele.
         Timothy Barinni  sabia que a capitão ficaria de olho nele. Se ele fosse ela ficaria. Ele era um homem de ação. Não ficaria toda a viagem fazendo piqueniques. Quando ouvia a palavra “proibido” sua veia jornalística saltava. O problema era comprometer a sua família. Quando estava perto deles não se sentia à vontade para fazer o seu trabalho. Mas como a sua mulher lhe disse antes de partir...”Esta será uma boa oportunidade para aprender algo sobre convivência familiar”.
         Ao retornar para o holodeck  adentrou em uma paisagem de um bosque tranqüilo com canto de pássaros e um pequeno lago onde patos eram alimentados com miolo de pão pelos seus dois filhos. Deitada sobre uma toalha xadrez estava sua esposa repousando, alheia às estripulias de seus rebentos. Timothy aproximou-se devagar, ajoelhou-se próximo à ela e a beijou na testa. Liz abriu os olhos.
         - Oh....Meu príncipe retornou...- disse ela quase num murmúrio.
         - Oi princesa. Os garotos se comportaram?
         - Eles estão amando. Por que demorou ? Você está melhor ?
         - Sim, um pouco. Estive dando umas voltas por aí.
         - Lembre-se do que o imediato falou. Andar somente nas áreas permitidas. Se te pegam em algum lugar não permitido vai passar o resto da viagem em confinamento e adeus reportagem.
         - Já pegaram. Ou melhor... Quase. Encontrei-me com a capitão. Na verdade ela me encontrou.
         - Oh Deus, Tim...Você não estava fazendo nada errado, não é? – Liz sentou-se sobressaltada com a confissão do marido.
         - Não, claro que não. Acalme-se. Ela apenas advertiu-me em não pensar em meter o nariz onde não sou chamado. E depois nos convidou para jantar. Na verdade foi quase uma ordem. Ela parece ser uma mulher durona, porém simpática. Intrigante, não?
         - Será que preciso ir com alguma roupa especial? Eu não trouxe nada de gala.
         - Qualquer coisa poderemos pedir pelo sintetizador. Mas acredito que o traje seja formal. Está gostando da viagem ? – Barinni muda de assunto.
        - O holodeck faz nossos sonhos quase virarem uma realidade. É o que tem me distraído e às crianças nestes dois dias de viagem. Eu poderia passar o resto da vida aqui. Tudo é tão calmo...Tão perfeito... – comenta Liz.
         - Eu também poderia ficar por aqui um bom tempo.
      - Sério? Estou te estranhando. Computador. Informe quantos humanos estão dentro do holodeck neste momento.
         <Quatro seres humanos estão presentes.>
         - Muito engraçado, Liz. – Barinni não gostou muito da brincadeira.
        - Desculpe, amor. Mas tinha que me certificar. – Ela o abraçou e beijou-lhe a nuca – Afinal você ficar relaxando em uma paisagem bucólica não é de sua natureza. Admita.
      - Você está certa. Na verdade estou ansioso para chegarmos logo. Não consigo ficar muito tempo sem ter o que fazer. Além do mais ainda me sinto culpado por ter arrastado vocês para a minha loucura.
      - Ei! A loucura foi nossa. Eu concordei com isso. Estou até atuando pelos Médicos Sem Fronteiras! Deus sabe que precisava voltar a trabalhar. É uma grande oportunidade e responsabilidade. Não exerço a medicina desde quando engravidei do Michael. E agora terei a chance de provar para mim mesma que ainda sou capaz. – ela percebia o desconforto de seu marido – Querido... Eu também me sinto culpada por trazer nossos filhos para uma zona de guerra, mas como você mesmo disse, a verdade precisa ser contada. Eu estou aqui porque quero fazer a minha parte.
         - Nós somos loucos e egoístas. Talvez devamos pegar o primeiro vôo de volta à Terra quando chegarmos à base 375.
        - Chegamos longe demais para dar pra trás agora. Somos uma família e juramos ficar juntos na alegria e na tristeza. Nos tempos fáceis e difíceis, lembra-se?
       - Só penso se é justo com eles... – diz Barinni se referindo aos seus filhos que estavam brincando a beira do lago.
     - Ei...Somos uma família. Eles também fazem parte dela. Afinal quem poderia protegê-los melhor além de nós mesmos?
       - A Kobliad que Omala enviou? – brinca Barinni.
        
       Liz ri. A segurança pessoal era de uma espécie pouco amigável, mas extremamente cuidadosa e cumpridora contumaz de seus contratos. Havia sido contratada para tomar conta do sobrinho de Omala e assim estava fazendo desde que vieram à bordo. Não o deixava nem por um segundo. A família Barinni era um sub-contrato que daria atenção no momento necessário. Assumira que a Frota estava suprindo a segurança necessária até chegarem ao sistema bajoriano.
       - Por falar nisso onde eles estão? – perguntou Liz.
      - Confinados no alojamento. A Kobliad não acha seguro ele ficar circulando pela nave.
      - Pelo menos está fazendo jus ao que seu chefe está pagando. -  Agora era a vez de Liz mudar de assunto. -  Então quais são seus planos?
      - Se te contar terei que te matar. – brincou Barinni insinuando que não podia revelar nada sobre o que estava pretendendo fazer.
       - Fale sério... – clamou sua esposa.
      - Na verdade eu ainda não sei. Espero ter alguns insights quando chegarmos. Vou esperar os acontecimentos  se desenrolarem e documentá-los.
     - Não se preocupe. Tudo vai dar certo. – disse Liz abraçando-o. – Podemos conseguir muita coisas com essa viagem. Pra começar estamos sendo uma família de novo.
      - Nós nunca deixamos de ser. – protestou Barinni.
   - Lá vamos nós de novo...- reclamou Liz antevendo um início de uma nova discussão.
      - Eu nunca quis deixá-los fora da minha vida.
      - Mas acabava deixando mesmo assim.
      - Isto não é verdade. – Barinni não queria admitir seu erro.
      - Eu não quero brigar. Não podemos simplesmente ficar aqui quietinhos respirando o ar puro? – suplica Liz.
     - Liz... Eu nunca quis magoar você ou os meninos. As minhas ausências eram por causa do meu temperamento hiperativo. Sou movido a desafios. Quando vejo uma história que deva ser contada eu esqueço do resto.
     - Eu sei. Mas desta vez será diferente. Você tem a mim e aos garotos. – De repente Liz para e um pensamento lhe vem à tona. – É por causa disso o seu desconforto? O enjôo espacial? Você está preocupado com a nossa segurança e com medo de não poder fazer o seu trabalho?
     - Em parte talvez seja verdade.
    - Então eu e as crianças somos um fardo para você. – Liz se levanta aborrecida. – Por que então insistiu para que viéssemos?
    - Eu queria...Eu quero dar uma chance para nós. Ei, você não tinha acabado de dizer que não queria brigar?
    - Timothy Barinni você é incorrigível! – sorri Liz ainda enxugando algumas lágrimas do rosto. Timothy se aproxima e a abraça.
    - Não quero deixá-la triste ou aborrecida. É que só de pensar que teremos que ficar três semanas nesta nave está me deixando...
    - Louco? – completa ela.
    - Desconfortável. – corrige ele.
   - Um bom eufemismo...Em breve você estará trabalhando e ficará bem. Enquanto isso você terá a mim e aos meninos. Há muito tempo que não temos um tempo para a família. Venho esperando por isso há pelo menos cinco anos e não quero desperdiçar nenhum minuto. – ela o beija selando a paz.
   - Você está certa. Eu reconheço que não tenho sido justo com você e com as crianças ultimamente. Não vou fazer falsas promessas, mas vou me esforçar em não pensar tanto no trabalho. Na verdade é  em vocês que eu penso o tempo todo quando estou fora fazendo as minhas reportagens. É de vocês que retiro forças para continuar fazendo o que eu faço.
  - Oh, Tim... – Liz fica emocionada com a declaração do marido e o beija ardorosamente. Contudo a cena romântica é interrompida com a aproximação dos seus filhos aos berros.
  - Pai! Pai! Encontramos uma caverna! Vamos explorá-la? – disse o pequeno e curioso Michael.
  - Uma caverna? Que legal! Me mostra onde é. –  Um sorridente Timothy Barinni é levado pelas pequenas mãos de seus filhos para longe de sua esposa e de sua crise existencial.

   Liz observa o entardecer artificial e seu marido brincando com os filhos. Gostaria de congelar aquela cena para sempre. Infelizmente a vida real não podia ser programada.

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